Lúcio
Emílio do Espírito Santo Júnior,
graduado em Filosofia e Mestre em Estudos Literários.
Professor da UNIPAC/Bom Despacho.
O
texto Rastros na Poeira acabou cobrindo uma lacuna na literatura
de nossa cidade e da região centro-oeste. Focalizou
os doidos, os tipos populares e anônimos, junto a
expoentes da sociedade local. Ocupou-se de algo hoje muito
valorizado: a micro-história, o detalhe, o comportamento
na vida cotidiana, a influência da política
na vida dos cidadãos comuns de um outro tempo. Os
Rastros na Poeira são, de fato, marcas do que ficou:
"Biografias, tipos populares, velhas histórias,
contos." Algumas curtas passagens ilustram, por exemplo,
o clima reinante na Era Vargas:
Aconteceu, porém, que a nossa conferência adotara
um novo confrade, além dos seis nomeados inicialmente.
Era um senhor respeitável, sério, um pouco
mais velho que nós, com o histórico de atuante
e piedoso, mas conhecido pelo seu fanatismo getulista. Naquela
noite, enquanto tomávamos café e aguardávamos
o horário de início da sessão, comentávamos
política com duras críticas a Getúlio.
Por infelicidade, nosso confrade getulista entra nesse exato
momento e percebe a natureza do assunto. Calamo-nos repentinamente
em respeito à sua pessoa, mas um pouco contrafeitos.
Tomou o café, manteve-se em silêncio até
o início da sessão, participou dos trabalhos
sem dizer uma única palavra, saiu sem se despedir.
Nunca mais voltou.
Acho
que abandonou a Sociedade Vicentina. Seu coração
pulsava mais forte pelo getulismo (MORAIS, 2003, p. 118)
Assim podemos notar que a Era Vargas, mais do que um conteúdo
de História, passível de ser cobrado em concursos
e no vestibular, deve ser algo entendido também pelas
alterações que provocou no cotidiano. Assim
sendo, o autor de Rastros na Poeira conseguiu tirar do momento
passageiro ou da fala descompromissada um importante depoimento
político. O sociólogo da UFJF Gilberto Vasconcellos
já disse que ninguém escreveu sobre a vida
cotidiana na Era Vargas. Rastros na Poeira deixa pistas
dessa vida cotidiana e facilita compreender a relação
(conflituosa) de Minas com Vargas e, principalmente, os
católicos anti-varguistas, a rejeição
de Vargas e o apagamento de sua herança histórica
no país, apagamento esse hegemônico nos dias
correntes e operado por FHC e Lula sem que esse passado
nem sequer, às vezes, esteja bem entendido ou bem
resolvido.
fale
com o Lúcio:
lucio@bdonline.com.br
Outro
texto do Lúcio:
Fiotinha
e a Língua da Tabatinga
- Tânia Nakamura e Lúcio Emílio