GENTE
DE BOM DESPACHO |
O
fascínio das biografias
JACINTO GUERRA
jacinto.guerra@bol.com.br
Num
interessante artigo sobre a biografia como gênero literário,
Ronaldo Cagiano comenta o meu livro "Gente de Bom Despacho
- Histórias de quem bebe água da Biquinha",
com lançamentos programados para Minas e Brasília,
no período março-abril de 2003, com apoio do
Sesc-MG e do jornal MG TURISMO. O estudo literário
que Cagiano escreveu a respeito desse livro orienta o leitor
nos caminhos da história e da memória, mostrando
o valor das biografias na literatura contemporânea.
1995 foi o ano que marcou a entrada definitiva, no Brasil,
da biografia como gênero literário popular, quando
três livros estiveram, ao mesmo tempo, na lista dos
mais vendidos em nosso país: as vidas do Barão
de Mauá, um grande empreendedor, de Assis Chateaubriand,
jornalista e poderoso empresário, e de Garrincha -
alegria do povo, como jogador de futebol - são obras
de literatura que encantaram grande número de leitores
em todo o País.
Na
biografia, que pode ter o fascínio do ensaio e do romance,
o leitor não só vive as emoções
próprias da literatura que conta a vida das pessoas,
como também se diverte e aprende muita coisa, até
mesmo sem perceber.
Os escritores Jorge Caldeira, com a biografia de Mauá;
Fernando Moraes, ao escrever "Chatô, o Rei do Brasil"
- e Rui Castro, com sua "Estrela Solitária",
contando a vida de Garrincha, deram uma dimensão maior
e mais ampla a um gênero literário capaz de superar
o ensaio e o romance, porque a biografia consegue uma interação
muito grande com o leitor.
Um livro que começa a despertar muito interesse, inclusive
internacional, com propostas de edição nos Estados
Unidos, Espanha, França, Itália, Alemanha e
Japão, é "Lula, o Filho do Brasil",
de Denise Paraná. Trata-se, até hoje, da mais
completa biografia do retirante e líder sindical Luiz
Inácio Lula da Silva, que chegou à Presidência
da República, numa incrível trajetória
da "pobreza à cultura da transformação",
como define a escritora, em seus estudos psicológicos
e históricos.
O
livro"Gente de Bom Despacho - Histórias de quem
bebe água da Biquinha", que Pedro Rogério
Moreira e Ronaldo Cagiano tanto recomendam, reúne mais
de cem personalidades de classes diversas que - a partir de
Bom Despacho como matriz de história e memória
- projetam-se na comunidade, destacam-se Brasil afora e alcançam,
até mesmo, alguns países distantes.
Neste
ponto, encontra-se a novidade, a surpresa e o fascínio
que o livro vai despertar, porque, geralmente, os biógrafos
não se lembram do cidadão comum, nem dos heróis
anônimos, sobretudo das cidades pequenas e médias.
Se Fernando Pessoa estivesse entre nós, diria, certamente,
que vale a pena ler e guardar, com muito carinho, esse "Gente
de Bom Despacho", que tem um "quê" de
universal, na linha de Tolstoi, com a pintura de sua aldeia
- e de Adélia Prado, ao dizer, num verso, que o cotidiano
de Divinópolis é o mesmo de Hong Kong, só
que o primeiro é falado em português...
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aqui para ler outro artigo de Jacinto Guerra
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Capa
do Livro |
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Comentários |
O
escritor mineiro Manoel Lobato dá um caráter
nacional ao novo livro de Jacinto Guerra, envolvendo, na sua
trama, até o presidente da República, Luiz Inácio
Lula da Silva
Gente
de Bom Despacho em textos biográficos
Manoel Lobato
Desde
menino conheço o medicamento chamado I.Auris-Sedina,
contra dor de
ouvido. e Pílulas de Erva Ide Bicho Compostas Imescard,
além de Pílulas de ~ Lussen. Minha mãe
era ~ farmacêutica licenciada; herdou a botica de meu
pai, prático de farmácia. Ele morreu quando
eu tinha seis anos, de modo que nem me lembro dele. Mamãe
viveu desde criança até a velhice em Açaraí.
lugarejo na Zona da Mata ou Vale do Rio Doce, comarca de Ipanema.
bibocas de Minas Gerais, cafundó-do- judas. Fiz o curso
de farmácia, pensando em ser sócio de mamãe.
Ela não quis sociedade. Terminou a vida como minha
empregada em Belo Horizonte. Trabalhou durante dez anos em
minha drogaria. perto da rodoviária,La- goinha, com
carteira assinada, salário míni mo. O INSS recusou-se
a aposentá-Ia. O fiscal alegou que seria falso o registro.
Ela morreu em 1996 com 92 anos.
Descubro agora que Joaquim Henriques Cardoso nasceu em Bom
Despacho em julho de 1896. numa fazenda do C6rrego da Areia.
Diplomado
em farmácia e medicina, ele é o criador das
f6rmulas dos produtos que conheço desde a meninice
e que existem até hoje. Fico sabendo que a palavra
Imescard "é formada por sílabas do nome
de seu criador, Joaquim Henriques Cardoso: 'im´’
de Joaquim; 'es' de Henriques, e 'card" de Cardoso "
Ele foi sócio de Osório de Moraes em laboratório
industrial farmacêutico que se transferiu para Belo
Horizonte.
Tudo isso está no livro de Jacinto Guerra, "Gente
de Bom Despacho", com o subtítulo de "Histórias
de quem bebe água da Biquinha", que será
lançado em 1de julho próximo, na Assembléia
Legislativa, na capital. O autor me manda um exemplar de sua
obra.
Vou destacar outra curiosidade: na página 341 vem o
texto biográfico da professora Valdira Maria Rezende
Silva, nascida em Bom Despacho, óbvio. Por isso figura
no livro, entre uma centena de conterrâneos.
Transcrevo: "Em 1964, quando Valdira fez 15 anos - idade
de grandes sonhos e esperanças -seu pai foi preso pelo
regime militar que dominou o país, permanecendo incomunicável,
acusado de subversão à ordem vigente. Pai adotivo
de Valdira Maria, nordestino de Salgueiro, Pernambuco,
José Pe dro Barbosa era um idealista que, depois de
muitas lutas e sofrimentos, entusiasmou-se com as idéias
socialistas e passou a lutar em defesa dos trabalhadores rurais,
seus com- panheiros ao longo de toda a sua vida..Morreu em
novembro de 1973.
O então governador de Minas Gerais, Ma- galhães
Pinto, recebia o líder José Pedro Bar- bosa,
demonstrando certo apreço pelo movi- mento dos homens
do campo, gente humilde, roceiros, lavradores. assalariados.
Mais tarde o político Magalhães Pinto bandeou-se
para o lado dos revoltosos; tornou-se um cabeça do
golpe militar, na çondição de chefe civil.
Hoje a esquerda está no poder em regime democrático.
O presidente da República atual tem pose messiânica,
prestígio popular, discursa de improviso, fala muito
que vai consertar este país, mencionando o nome de
Deus a torto e a direito. Lula é conterrâneo
de José Pedro Barbosa, pai adotivo de Valdira Maria.
Há apenas uma diferença: por enquanto Lula não
adotou ninguém em Bom Despacho.
( Trancrito do jornal O TEMPO – Belo Horizonte –
5 de junho de 2003 )
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Gente
de Bom Despacho – Uma biografia coletiva
Adércio Simões Franco
Fazer biografia de determinada pessoa não
é tarefa fácil. Não se trata, apenas,
de dizer onde nasceu, onde morreu (se for o caso) e o que
foi na vida. O escritor terá de ir a fontes, às
vezes não fidedignas e corre o risco de disseminar,
isto mesmo, de disseminar idéias errôneas do
seu biografado.
Imagine agora o que é fazer biografia
coletiva! O escritor que se dedica a esta tarefa merece todo
o aplauso pelo trabalho realizado. Lutando muitas vezes com
informações incoerentes ou com a desconfiança
das pessoas procuradas como informantes, cabe ao historiador
o trabalho de garimpo: encontrar ouro nos aluviões.
Jacinto Guerra é um desses garimpeiros,
quando escreve Gente de Bom Despacho -histórias de
quem bebe água da Biquinha. Trabalho de garimpo, por
ser o primeiro desta natureza a focalizar Bom Despacho. Leitura
agradável, leve.
O importante do livro é que o autor
não procura somente gente de hierarquia social mais
elevada – a obra reflete uma sociedade em que todas
as classes são contempladas. Assim, o político,
o padre, o professor, o comerciante estão presentes
nesta obra: homens e mulheres que, pelo seu trabalho honesto
e aparentemente sem grandes dimensões, engendram a
sociedade e servem de exemplos para as gerações
futuras.
Outra nota importante do livro é a
presença de muitos biografados ainda vivos. Infelizmente,
em muitos lugares, a pessoa precisa morrer primeiro para receber
homenagem e possivelmente ter seus méritos reconhecidos.
Às vezes, no calor ainda da morte, a pessoa vira nome
de escola ou de alguma outra instituição qualquer.
Às vezes também, vira nome de rua, e pronto
– está cumprida a obrigação da
homenagem!
Ora, é gratificante que as pessoas
vêem em vida, que não viveram em vão,
que o seu dia-a-dia, muitas vezes modesto, serve de exemplo
para as gerações que estão assumindo
a sociedade. Ainda mais agora que o Brasil deixou de ser chamado
país do futuro, e a longevidade está sendo uma
realidade entre nós. A sabedoria dos que atingiram
a melhor idade, cronologicamente, seja quarenta ou oitenta
anos, não se construiu da noite para o dia. Eles são
lições de vida.
São essas lições de vida
que encontramos em Gente de Bom Despacho – o trivial,
o folclórico, a estória cruzando-se com a história.
Vale a pena a sua leitura!
Guerra, Jacinto. Gente de Bom Despacho: histórias
de quem bebe água da Biquinha. Brasília: Thesaurus,
2003. – R$35,00 – 061-244-2747 – jacinto.guerra@rbsturbo.com.br
Jacinto Guerra, escritor, professor, desde
a adolescência sempre um entusiasta pela sua terra.
Bibliófilo, é o fundador da Biblioteca Municipal
de Bom Despacho, que veio a receber o seu nome. Autor de outros
livros, inclusive uma biografia de Juscelino Kubitscheck de
Oliveira – JK, triunfo e exílio – também
publicado pela Thesaurus: ele que exerceu função
de assessoria e pesquisa no Memorial JK, em Brasília.
Adércio Simões Franco é
mestre em Letras pela Pontifícia Universidade Católica
do Paraná. Reside em Divinópolis, Minas Gerais.
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